CURADORIA #08 - A agenda
Em busca da "agenda perfeita": àquela que acolhe o trabalho, a vida e muito mais.
Eu estudo a minha agenda. Busco compreender, a cada ano, o que deu certo e o que não deu. Tento dar conta dos lapsos, das falhas, dos esquecimentos e das prioridades que ficaram invertidas.
Eu estudo a minha agenda. Busco construir a agenda perfeita, áquela que guarda tempo para o trabalho e para vida que é muito além.
Eu estudo a minha agenda e tento - a cada ano - remanejar o tempo de modo a caber vida nos meus dias e para que eles sejam mais (muito mais) que trabalho!
Faço isso como cuidado comigo. Faço isso porque reconheço a minha tendência em priorizar o trabalho para além de todas as coisas.
(Essa foi uma das muitas heranças que herdei na vida: a de dar ao trabalho lugar central da vida! Por isso me esforço – com afinco - para resguardar tempo para a vida que não se encerra no trabalho.)
Por isso estudo a minha agenda.
Mantenho as contas, os gastos e os recebidos no consultório na ponta do papel para ter clareza e tranquilidade para compreender o que pode ser remanejado, o que pode ser cancelado, o que precisa ser adiado.
Com o tempo, compreendi que abrir espaço na agenda se tornou uma necessidade, não apenas para a saúde da analista mas também para manter a qualidade do trabalho clínico!
A verdade é que a analista cansada ouve mal e se enrola nas intervenções e manejos.
A analista cansada - engolida pela rotina - não possui tempo de qualidade para estudo, para a investigação do que se passa com os pacientes.
A analista cansada não tem tempo de leitura e pesquisa.
A analista cansada se atrofia na escuta e não alcança a flexibilidade necessária para o exercício da nossa profissão.
A analista cansada, por fim se empobrece.
E se por um lado nunca falamos tanto sobre cansaço, estafa e exaustão no consultório, é necessário confessar que também não estamos protegidos desse mal apenas por sermos psis. Não estamos imunes de sermos, também nós, engolidos pela lógica de produtividade que nos toma a todos.
Hoje, para além da análise, da supervisão e dos estudos, a analista é impelida a dar conta das redes sociais e se mostrar presente e atuante. Cria-se assim nova carga de trabalho, novas exigências e demandas e o tempo torna-se escasso.
Voltamos assim à importância da agenda! Esse objeto que materializa o tempo, as prioidades, as escolhas e os compromissos com os quais nos engajamos.
Voltamos à importância de que a analista avalie de tempos e tempos a sua rotina de trabalho reconhecendo, é claro, que momentos diferentes de vida nos exigirão ajustes específicos, agenda adaptada (alô analistas-mães!).
Por isso tudo, estudo a minha agenda!
Tomo-a nas minhas mãos e exercito os “nãos” e as escolhas necessárias para construir a clínica e a vida que almejo ter!
Um adendo (fundamental)
Compreendo, é claro, que infelizmente, muitos de nós psicanalsitas, ainda se veem tomados por essa realidade: esforçam-se em horas e horas de trabalho exaustivo, se adaptam para atender os horários possíveis e impossíveis, não rejeitam pacientes novos e se adequam às demandas de quem chega em busca de ajuda e atendimento.
Fazem isso porque lhes falta a possibilidade de dizer não. Falta a autonomia financeira. Falta a confiança de que o consultório sobreviva aos “nãos” necessários.
Por isso, precisamos trabalhar tanto, conjuntamente, para que a analista alcance a autonomia que lhe permita dizer “não”.
A pergunta que não quer calar é: se não nos organizamos coletivamente, se pensamos a administração do consutlório como algo exclusivamente individual e particular, como podemos pensar saídas, caminhos, suportes coletivos para essas questões?
Provocações para pensarmos como podemos articular rede, suporte e ambiente suficientemente bom.
Outro adendo (fundamental)
Se as leis trabalhaistas existem e defendem o trabalhador assalariado, o profissional autônomo pode ficar desprotegido no que diz respeito à carga horária de trabalho e suas condições.
Acompanhamos, também, a luta por definição da jornada de trabalho do psicólogo mas a ausência de orgãos de fiscalização do trabalho do analista nos deixa entregues a organzaição e definição individual. Cabe portanto a cada um de nós o discernimento sobre a carga horária que assumios durante a semana.
Nesse contexto, não é raro ultrapassarmos limites, nos adaptarmos demasiadamente às necessidades dos pacientes sem nos atentarmos para as nossas condições.
Por isso, avalie e cuide das horas diárias e semanais trabalhadas.
Para ajudá-los divido com vocês uma tabela simples, prática e super acessível com todos os horários da semana, com a espçao para valores pagos pelos pacientes e frequencia dos atendimentos para te ajudar a manter em dia o controle do faturamento do consutlório mas tambe para que você se atente a sua jornada de trabalho semanal.
Ter isso em mente nos ajuda (e muito!) na hora de fechar nda, de ena agecaminhar pacientes e exercitar os “nãos” necessários.
Espero que ajude vocês!
Clica aqui.
O consultório tem que funcionar para você
A gente aprende por aí que o analista winnicottiano é ambiente suficientemente bom e se adapta às necessidades de seus pacientes.
Nesse compromisso com a clínica e com o cuidado, lança seu olhar atento aos seus pacientes e acabam se esquecendo de olhar para si. Esquecem de se perguntar como se sentem diante de tantas necessidades distintas, de toda disponibilidade que uma clínica como essa exige.
Vez ou outra são importunados pela danada da contratransferência que os tira do lugar e os incomoda com alguma coisa, os fazendo parar, pensar e ouvir o que se passa dentro de si.
No fundo não se dão conta, mas o risco de uma atuação clínica que não olhe para o analista é se confundir com os próprios conceitos e cair na armadilha que nós mesmos criamos: confundir adaptação às necessidades com atendimento de todas as demandas de nossos pacientes!
Por isso, é necessário se libertar das ideias que carregamos desde os tempos de faculdade e admitir sem constrangimento que não precisamos dar conta de tudo e de todos. Dizer não a uma pessoa que quer se tornar paciente mas sobrecarrega a agenda, negar um pedido de remarcação, definir os limites do setting, defender o valor do seu trabalho... são modos de cuidar de si, de cuidar do ambiente e estabelecer condições para um encontro espontâneo e verdadeiro com o seu paciente!
Por isso o consultório precisa, antes de tudo, funcionar para o analista, precisa se encaixar no que ele pode oferecer, precisa respeitar o seu tempo de organização, de elaboração da vida, dos casos, de si.
(Caso contrário, ele se tornará mais um espaço mecânico, num entra e sai de pacientes, atendidos prontamente por uma legião de analistas cansados, estafados e esgotados.)
ATÉ BREVE!
Espero contar com você na minha próxima edição!
Ah! E para que o conteúdo da CURADORIA fique alinhado às demandas e interesses de vocês, fiquem a vontade para enviar sugestões, para dividir suas angústias na clinica, para enviar suas duvidas teóricas e de manejo… A ideia é que este seja, cada vez mais, um espaço de trocas ricas e potentes para nós!
SEGUIMOS JUNTOS!
Coisas grandes vêm à tona apenas quando deixamos espaço pra elas surgirem. Bendita seja a agenda para quem a tem na mão.
Fico sempre feliz de te encontrar na escrita apesar de não dividir a mesma profissão, Marina! :)